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quarta-feira, 23 de março de 2011

A PEREGRINAÇAO DO SERVO DE ISHTAR - Parte III





Finalmente chego ao Butão, entre as esquecidas fendas himalaias. Cannabis aqui é mato. Negócios à vista. Consumo proibido. Procuro traficantes. “Somos poucos, não faz parte da nossa cultura, pouca gente compra”. Um terreno. Faço minha plantação. Apenas mercado interno não vai prosperar. Mas vivemos num mundo globalizado, não é mesmo? Quem não vai desejar experimentar a legitima maconha butanesa? Associo com importadores chineses na fronteira. Agora sim, felicidade geral na nação. E as garotas? Onde estão as garotas? Não andam nas ruas sem um homem ao lado. E sempre encobertas pela broxante Khira. Tudo bem, sempre há o subterrâneo. E foi lá que conheci a garota do piercing. Que ousadia, fazer um piercing no Butão. O amor reprimido. Inesquecível, mágico. Por um momento achei que poderia fincar raízes naquela terra. Mas nunca é assim. A garota do piercing não é minha, é do mafioso chinês. “Os malditos chineses querem nos dominar. Essas porcarias industriais que eles trazem estão por toda parte”. Os butaneses se orgulham de nunca terem sido colonizados ou conquistados. “Resistimos aos imperialistas. Sempre vamos manter as tradições.” Percebo que não faço parte da tradição. Desfaço o negócio, desfaço o amor. E agora? Pra onde? Afinal, qual caminho desejo realmente seguir?  “Você deve subir aquela trilha. A mais alta montanha de Bumthang. Três mil metros até o Monastério de Guolishan. Ali encontrará a redenção”. Imediatamente me atrevo pela rota sinuosa, sem montaria, sem mochila, sem equipamento, sem água, sem pão, apenas a roupa que por acaso cobria meu corpo. Três dias de caminhada. Trechos estreitos e traiçoeiros. Só penso no topo. Não sinto sede, não sinto fome, não sinto remorso, não sinto medo. Nunca soube me explicar e não é agora que vou tentar. Majestosamente, enfim, a última curva se esvai. Toda a suntuosidade do templo se ergue a minha frente. Encaro os maciços portões de bronze. Nunca estive aqui, mas é tão familiar, como se sempre tivesse sido meu lar. Será aqui o meu destino, tão almejado, até então tão desconhecido e distante? Vinda de lá dentro, uma voz parece me chamar. Olho para a pesada porta, que parece se mover em minha direção. É ouro que a reveste? São diamantes que a ornamenta? Olho para os vales e as montanhas que devoram a paisagem além do templo. Olho para as nuvens cinzentas que pairam sobre mim, fiéis companheiras. Não posso mais fugir do meu destino. Dou meia volta e desço pela trilha serpenteante.



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2 comentários:

  1. Fica até dificil falar depois disso tudo

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  2. É fato nunca conseguimos fugir ou enganar o destino. Adorei o texto! ^^,

    Beijos!
    Taty!!!

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